Edutainment à brasileira e minhas restrições a ele


Além de mais um neologismo engraçado o termo Edutainment refere-se ao uso de recursos de entreterimento para fins educacionais, como programas de desenhos animados educativos ou jogos educacionais.  Um exemplo deste trabalho é o jogo Galeria dos Presidentes.

Porém seguindo a idéia do Resnick eu tenho minhas restrições ao Edutainment. O principal problema é que ele parece uma forma de disfarçar o aprendizado, como colocar um caramelo de diversão por cima do indigesto aprendizado da história. O problema da técnica é que crianças são espertas, lambem o caramelo e cospem a parte que consideram indigesta. Em termos práticos o que isso significa  que elas podem até jogar, mas vão tentar prestar o mínimo de atenção possível ao conteúdo para ficar jogando. Tenho essa impressão porque EU tentei fazer isso enquanto jogava, e olha que eu gosto de história.  Nas partes textuais a pessoa acaba tendo pressa de ler, ela vai absorver tão pouco conteúdo quanto possível para continuar jogando. Jogo e ensino estão no mesmo ambiente, mas não necessariamente cooperando entre si.

Um elemento formal dos jogos é a competição, o conflito interno entre qualquer jogo, que as vezes pode aparecer na forma de um competidor ou na superação dos obstáculos do próprio jogo. Isso significa que o participante de um jogo QUER ter noção de que está ganhando ou perdendo, o feedback é essencial e um dos motivadores para pessoas jogarem. É a sensação de superação, de vitória que motivo o jogador, ninguém joga para perder. Beck e Wade comentam isso como uma característica típica da geração dos jogadores de videogame, o direcionamento para obter sempre a melhor performance.   E mais, o feeback permite a reflexão, que é o momento em que o jogador reflete sobre seu desempenho em um jogo. É um momento de aprendizado rico em que ele vai pensar sobre o que jogou e talvez acrescentar algo ocorrido nesse ambiente em sua própria experiência, a idéia de Jarvis e Kolb sobre experiental learning. Talvez esse caso reflita a velha briga entre designers, instrucionais e de jogos, um reclama que o jogo deve ensinar e o outro que o design instrucional consegue destruir a diversão de qualquer jogo.  Enfim, esse alinhamento ainda é algo difícil. É o que chamo de “paraíso” do projeto transdisciplinar: trabalhar em conjunto geralmente significa trabalhar em conflito. Mas é deste que as soluções vão surgir.

Se a idéia é ruim?  Claro que não, um povo deve conhecer sua história e acho esse um esforço nobre. Portanto , ainda que tenha minhas restrições quanto a forma de execução da idéia, fico feliz em ver que há projetos se arriscando a contar a nossa história. Afinal, concordo com a idéia do Ken Robinson de que se dispor a errar é abrir caminho para a criação. O erro é o adubo da idéia.

Provavelmente também vou errar em meus projetos futuros, só espero cometer erros novos.

11 comentários em “Edutainment à brasileira e minhas restrições a ele

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  1. “O problema da técnica é que crianças são espertas, lambem o caramelo e cospem a parte que consideram indigesta. ”
    Adorei essa frase. 🙂

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  2. Gostei do post e concordo que é um grande desafio. Concebo educação como transformação da maneira como interpretamos os fatos, o mundo, as abstrações. É abrir mão de (pelo menos parte de) nossos conceitos e prespectivas para abraçar os de outros. Exige humildade, disciplina, reflexão e esforço em um processo muitas vezes tão desafiante quanto doloroso. Mas e o prazer de aprender? O prazer está no desafio do caminho. Está na constatação de que crescemos e que vemos o mundo de maneira mais precisa e mais ampla. Está na possibilidade de sermos mais autonômos e atuantes na melhora do mundo em que vivemos. Isso não é suficiente? Será que precisa mesmo de caramelo?

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  3. Re,
    Comecei a ler o seu blog um pouco tarde e devagarinho vou me atualizando sobre a sua vida e seu objeto de estudo. Achei muito interessante ver que apesar de cursos tão diferentes (o seu e o meu) estamos tocando um assunto em comum; é claro que no meu caso com muito menos profundidade. Mas enfim…essa parte do aprendizado incorporado no jogo para mim é uma idéia fantástica. Ela atinge a questão de que cada pessoa tem dentro de si uma capacidade de aprendizado diferente. Por exemplo, algumas pessoas tem uma capacidade de aprendizado mais verbal, outras mais visual, outras auditiva e assim por diante.
    Nosso sistema de educação atual tem uma maneira única de abordar a aprendizagem e todos as crianças que fogem deste padrão são obrigadas a procurar profisionais que criem um método educativo distinto para atender as suas necessidades. Eu creio que os jogos de videogame apelariam ( e ajudariam ainda mais) a pessoas cujo aprendizado através da memoria visual é o mais desenvolvido. Acredito que talvez ter um jogo que conte história de maneira interativa ou como uma diversão pode revolucionar o processo de ensino nem que seja para um publico alvo mais especifico. Esses jogos inclusive poderiam representar uma redução nos custos do tratamento de crianças com problemas de aprendizagem e ampliar o acesso desse tratamento a pessoas de baixa renda.
    Não creio que a leitura extensa estimularia o jogador, mas um desiging creativo, detalista e visando incorporar as partes educativas poderia ser um factor decisivo no jogo. Aliás poderia até oferecer mais que uma exposição teórica em clase de aula. Poderia incluir a vestimenta de época, a arquitetuta e as músicas. Creo que poderiamos até nos arriscar a dizer que os jogos formariam um processo mais integrado de ensino.
    Agora saindo umpouco da teoria, da suposição e da idealização dos jogos, queria comentar que certos jogos de computador são utilizados hoje por psicologos para ajudar ancianos na manutenção de suas habilidades cognitivas. Foi feito uma pesquisa e os jogos podem ser muito úteis para evitar que um ancião se torne senil.
    Nossa, falei demais. Como vc pode ver, eu gostei muito da sua área de trabalho.
    Bjos
    Lu

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    1. Hehe, nossos cursos tem mesmo coisas em comum. Alguns dos mais importantes teóricos de educação estão na psicologia, como Skinner, Piaget e Vygotsky. E alguns psicólogos que conheci mandam muitíssimo bem em termos de planejamento instrucional. E a parte dos jogos está totalmente certa, interessante saber dessa pesquisa. Poderia depois me passar a referência dela?

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